O ‘Eixo Geográfico’ da História
Desconhecido da maior parte do mundo, o objectivo da política externa dos EUA era assegurar sempre o controlo total, económico e militar, sobre a Rússia. Através das suas inúmeras instituições estabelecidas pelo Pentágono, CIA, Agência da Segurança Nacional, Agência dos Serviços Secretos/Inteligência da Defesa e numerosas agências de serviços secretos especializadas - o ‘establishment’ da política externa dos EUA funcionou com a finalidade de assegurar o controlo total sobre a Rússia, acima de todos os outros objectivos.
Mesmo
quando os Estados Unidos e a União Soviética ainda eram aliados formais na
guerra para derrotar a Alemanha, os Estados Unidos começaram a preparar-se para
a guerra com a União Soviética. No verão de 1945, na época da Conferência em
Potsdam, que concluiu a Segunda Guerra Mundial e poucos dias após o primeiro
teste bem-sucedido da bomba atómica no deserto do Novo México, o Pentágono dos
Estados Unidos estava a desenvolver, secretamente, a nova política americana de
inflingir o primeiro ataque - 'striking the first blow' – numa guerra nuclear.
O primeiro plano para usar todos os recursos numa guerra convencional contra a
União Soviética, chamado TOTALITY, foi elaborado pelo General Dwight Eisenhower
por ordem do Presidente Truman, em 1945. (17)
O
primeiro plano de uma guerra nuclear contra a União Soviética, incluindo um
ataque preventivo, foi concluído logo depois, pela Comissão de Conjunta dos
Serviços Secretos/Intelligence Committee, dentro do Estado-Maior Conjunto, dois
meses após Hiroshima e Nagasaki. (18)
Não
havia sentimentalismo em Washington sobre as exigências da guerra. Era estritamente
comercial - o negócio de estabelecer a supremacia americana incontestada -
orgulhosamente designada como o “Século Americano”. Segundo o mentor britânico
da geopolítica, Sir Halford Mackinder, a Rússia representava o “eixo geográfico
da História”(19) Num documento de política muito importante, em 1904, perante a
Royal Geographic Society, em Londres, Mackinder afirmava inequivocamente que o
controlo sobre a Rússia determinaria quem controlaria ou poderia comandar as
vastas extensões da Eurásia e, por extensão, o mundo inteiro. O Foreign Office
britânico concordou inteiramente com ele.
Há
mais de um século, Mackinder estava convencido de que, enquanto a Europa se
expandia para a Índia, para África e para outros territórios coloniais, o
Estado russo, estabelecido na Europa Oriental e na Ásia Central, expandia-se
para sul e leste, organizando uma vasta extensão de recursos naturais e humanos. Ele previu, que esse espaço enorme, em breve, estaria coberto por uma
rede de ferroviária, aumentando muito a mobilidade e o alcance estratégico do
poder terrestre, pela primeira vez na História.
Contra
esse pano de fundo geo-histórico, Mackinder identificou o núcleo norte-centro
da Eurásia como o “Estado eixo” ou o “coração” da política mundial. Ele colocou
a Alemanha, a Áustria, a Turquia, a Índia e a China - terras imediatamente
adjacentes à região do eixo - num “crescente interior” ao redor da “Heartland”/região
central vital ou do Estado eixo.
Advertiu
que, “O excesso de equilíbrio do poder a favor do Estado eixo, resultante da
sua expansão sobre os territórios marginais da Eurásia, permitiria o uso de
vastos recursos continentais para a construção de uma frota e então, o império
do mundo estaria à vista.(20)
Como
Mackinder percebeu, uma aliança russo-alemã, ou um império sino-japonês que
conquistasse a Rússia, seria capaz de lutar pela hegemonia mundial. Em ambos os
casos, “a orla oceânica seria acrescentada aos recursos do grande continente”,
criando as condições geopolíticas necessárias para produzir uma grande potência
que estaria a cima de todas as outras, tanto em terra como no mar.
A
política externa britânica, desde a guerra russo-japonesa de 1904 até a criação
da NATO em 1949, tinha sido obviamente baseada na análise de Mackinder.
Dedicava-se a impedir, a todo custo, o aparecimento de um poder coeso, no eixo
euro-asiático centrado na Rússia e capaz de desafiar a hegemonia global
britânica.
No
entanto, neste ínterim, as partes opostas de Mackinder do outro lado do
Atlântico, nos Estados Unidos, estavam a desenvolver as suas próprias ideias
sobre o que designavam como ‘destino inequívoco da América’ - um império global
americano. A América tinha conquistado os seus territórios ocidentais até ao
Oceano Pacífico, e alcançou a vitória na sua disputa desigual com a Espanha, em
1898. A conquista das Filipinas, longe das costas americanas, na sua primeira
guerra declaradamente imperial, deu ao ‘establishment’ político e financeiro da
América, a sua primeira experiência de como poderia ser o poder imperial
global.
Quase
concomitante com o ensaio de Mackinder sobre a geopolítica eurasiática, em
1904, Brooks Adams, um propagandista americano influente, previu o advento de
um império mundial americano e a conquista pelos Estados Unidos de todo o
espaço geopolítico da Eurásia.(21) Descendente de uma das mais respeitadas
famílias da elite, que remontam aos fundadores dos EUA, Adams influenciou
profundamente os dirigentes americanos da sua época, incluindo os seus amigos
mais íntimos, os Presidentes Theodore Roosevelt e Woodrow Wilson.
Durante
a Guerra Fria, no início dos anos 1950, as ideias de Brooks Adams,
particularmente a sua justificação de um império global americano conquistando
o continente eurasiático, foram evocadas como o guia político para o planeamento
da Guerra Fria nos EUA.(22)
Adams
havia promovido uma política de expansionismo agressivo destinada a transformar
a Ásia numa colónia americana, dando aos Estados Unidos uma fronteira vasta e recém-adquirida,
na Ásia. A conquista das Filipinas pelos EUA, em 1898, na Guerra Hispano-Americana,
foi concebida como o primeiro passo desse processo. Esse expansionismo, uma
espécie de “Destino Manifesto” global americano, permaneceu como a meta consciente,
embora não mencionada, dos estrategas de vanguarda da política externa, durante
toda a Guerra Fria e para além dela.
Os
arquitectos americanos do poder do pós-guerra - centrados em torno do poderoso
Conselho de Relações Exteriores, da Fundação Rockefeller e, acima de tudo, da
facção Rockefeller na política e na economia dos EUA - tinham adoptado como
sua, a visão geopolítica de Mackinder. Os principais estrategas da facção Rockefeller, incluindo Henry Kissinger e, mais tarde, Zbigniew Brzezinski,
ambos integrados na poderosa facção Rockefeller da política dos EUA, foram
treinados na geopolítica de Mackinder.
No
livro, ‘The Grand Chessboard’,
Brzezinski anunciou a vitória dos EUA na Guerra Fria, contra o seu adversário
geopolítico vitalício, a Rússia Soviética. No entanto, na sua opinião sobre os
supostos aliados da América na Europa Ocidental, expressou a arrogância do
poder. Ele declarou:
Resumindo, para os Estados Unidos,
a geoestratégia eurasiática envolve a gestão intencional dos Estados geoestrategicamente
dinâmicos ... Para colocá-la numa terminologia que remonta à era mais brutal
dos antigos impérios, os três grandes imperativos da geoestratégia imperial são - evitar conspirações e manter a dependência da segurança entre os vassalos,
manter os tributários flexíveis e protegidos e impedir que os bárbaros se unam.(23)
Brzezinski
declarava abertamente o ponto de vista tácito das elites políticas vitoriosas
dos Estados Unidos em relação às nações da União Europeia e da Eurásia, na
senda da sua vitória na Guerra Fria. Traduzido em linguagem simples, Brzezinski
afirmou que o estatuto único de superpotência dos Estados Unidos seria mantido,
para evitar “conspirações” - uma palavra grosseira para designar a cooperação
bilateral - entre os Estados soberanos da Eurásia. Com efeito, significava impedir
que os países da Eurásia desenvolvessem os seus próprios pilares de defesa ou
estruturas de segurança independentes da NATO, controlada pelos EUA. Os
"bárbaros" foram uma referência clara de Brzezinski à Rússia, à China
e às nações da Ásia Central.
Mackinder transmite o Projecto
da Guerra Fria aos EUA
Durante
a Segunda Guerra Mundial, o mentor intelectual de Brzezinski, Mackinder, tinha
sido convidado pelo ‘Foreign Affairs’,
o prestigiado jornal do Council on Foreign Relations, para delinear os seus
pensamentos sobre a geopolítica do pós-guerra.
O
artigo resultante, publicado em 1943, previa a chegada da Guerra Fria. Mesmo
antes do resultado da Segunda Guerra Mundial ser claro, Mackinder escreveu:
A conclusão é inevitável: se a
União Soviética surgir desta guerra como conquistadora da Alemanha, ela deve
ser classificada como a maior potência terrestre do mundo. Além do mais, ela
será o Poder em posição defensiva, estrategicamente mais forte. A Heartland
(Rússia e China)é a maior fortaleza natural da Terra. Pela primeira vez na História,
está guarnecida por uma guarnição suficiente tanto em número como em qualidade.(24)
Em
1919, num trabalho preparado para os representantes britânicos nas negociações
de paz de Versalhes, Mackinder apresentou o seu mais famoso ditado da
geopolítica. Segundo a sua opinião, a estratégia do Império Britânico tinha de
ser a de impedir, a todo custo, uma convergência de interesses entre as nações
da Europa Oriental - Polónia, Checoslováquia, Áustria-Hungria - e a centenária ‘Heartland’
Eurasiática centrada na Rússia. Mackinder resumiu as suas ideias com o seguinte
ditado:
Who
rules East Europe commands the Heartland; Quem governa a Europa Oriental,
comanda a Heartland
Who
rules the Heartland commands the World-Island;
Quem governa a Heartland, comanda a Ilha do Mundo;
Who rules the World-Island commands the world.(25) Quem governa a
Ilha do Mundo, comanda o mundo (25)
A
Heartland de Mackinder era o núcleo da Eurásia – a Rússia e a Ucrânia. A Ilha
do Mundo era toda a Eurásia, incluindo a Europa, o Médio Oriente e a Ásia. A
Grã-Bretanha, na visão de mundo de Mackinder, nunca fez parte da Europa
continental; era uma potência naval e marítima separada e deveria permanecer
assim, qualquer que fosse o custo.
A
perspectiva geopolítica de Mackinder moldou a entrada da Grã-Bretanha na Grande
Guerra de 1914 e moldou a sua entrada na Segunda Guerra Mundial. Deu
forma às provocações calculadas de Churchill para induzir a Rússia soviética a
uma “Guerra Fria” com a Grã-Bretanha, a começar já em 1943. Ao forçar
Washington a unir-se à Grã-Bretanha contra a URSS, a Grã-Bretanha calculou
cinicamente que Washington seria forçado a confiar nas capacidades políticas globais
superiores de Londres. Portanto, a Grã-Bretanha permaneceria ‘no jogo’.
Em
1997, na sua função de antigo Conselheiro da Segurança Nacional dos EUA,
Zbigniew Brzezinski baseou-se na geopolítica de Mackinder como sendo a
estratégia principal que permitia que os Estados Unidos permanecessem a única
superpotência após o colapso da União Soviética. (26)
Precisamente
dois anos após o artigo de Mackinder, sobre os Negócios Estrangeiros, em 1943, que
delineava o seu plano geopolítico para o domínio global dos Estados Unidos, o
Primeiro Ministro, Winston Churchill, acrescentou outra voz de Mackinder ao coro.
Em Abril de 1945, Churchill começou a agitar o General Dwight Eisenhower e o Presidente
Roosevelt para iniciar uma guerra imediata contra a União Soviética, usando até
12 divisões alemãs capturadas - prisioneiros de guerra - como carne de canhão
para destruir a Rússia de uma vez por todas.
Ironicamente,
considerando a política dos EUA depois de 1990, Washington rejeitou a proposta
de Churchill como sendo “muito arriscada”.(27) De facto, parece que Washington
já havia chegado à conclusão de que os seus interesses em dominar todo o mundo
não-comunista eram mais bem servidos por uma União Soviética hostil. Enquanto a
Europa Ocidental e uma Ásia centrada no Japão, se sentissem militarmente
ameaçadas pela União Soviética ou pela República Popular da China, apesar de
relutantes, elas curvar-se-iam, mais ou menos, às exigências de Washington,
como “Estados vassalos”, assim designados por Brzezinski.
Em
1945, quando o Presidente Harry S. Truman ordenou ao General Eisenhower e aos
Chefes Adjuntos que preparassem planos secretos para um ataque nuclear surpresa a cerca de 20 cidades da União Soviética, sabia-se que a União Soviética não
representava nenhuma ameaça directa ou imediata para os Estados Unidos. (28)
O
plano secreto de guerra nuclear, designado pelo nome de código, “Vulnerabilidade
Estratégica da U.R.S.S. a um Ataque Aéreo Limitado”, foi o primeiro plano de
guerra americano cujo objectivo era obliterar a Heartland Russa. Não seria, de
modo algum, o último desses planos.
Moscovo
abalou Washington ao testar a sua própria bomba atómica, em 1949, bem como
bombas de hidrogénio logo de seguida. Quando os russos demonstraram a
capacidade de lançamento de mísseis balísticos através do lançamento arrojado do
satélite espacial Sputnik, em 1957, as elites políticas dos EUA foram forçadas
a colocar no gelo, o seu sonho de ‘first strike’ nuclear, designado “predomínio
nuclear”. Permaneceu no gelo durante mais de meio século, até que Donald Rumsfeld,
Dick Cheney, Paul Wolfowitz e um pequeno grupo de neoconservadores de ‘falcões
de guerra’ (de militares) da administração de George W. Bush o ressuscitou,
depois de 11 de Setembro de 2001. A ‘doutrina Bush’, a política da guerra
preventiva, agora incluía a doutrina do ataque nuclear preventivo.
Daquele
ponto em diante, um poderoso segmento da liderança militar-industrial dos EUA e
as suas elites políticas estavam preparados para renovar os esforços para
alcançar a superioridade nuclear do ‘first strike’ (primeiro ataque). Essa foi
a verdadeira razão pela qual, o conflito na pequena Geórgia, em Agosto de 2008,
teve um potencial tão aterrador para os governos europeus mais bem informados.
Felizmente, a maioria dos americanos foram abençoadamente mantidos na ignorância
desses problemas impressionantes, por uma comunicação mediática amplamente
controlada e por uma barreira de desinformação da Casa Branca.
A Nova Guerra Fria — Rodear a
Rússia e a China
O
primeiro plano de guerra do Pentágono para o ‘first strike’ nunca foi
concretizado. A detonação realizada pela União Soviética da sua bomba atómica,
em Agosto de 1949, apanhou os planeadores dos Estados Unidos completamente de
surpresa. O rápido desenvolvimento da bomba atómica russa mudou o cálculo de um
‘first strike’ das décadas seguintes e, o que teria sido uma guerra quente, veio a ser a Guerra Fria.
No
entanto, em 2007, vários dos principais formuladores da política dos EUA consideraram-na
como um negócio inacabado para realizar o total e absoluto desmembramento da
Rússia como um eixo independente para a Eurásia. Os mísseis nucleares eram
apenas uma ferramenta num vasto arsenal de armas e campanhas enganosas a ser
estabelecidos para cercar a Rússia. O seu objectivo era, em última análise,
destruir a única potência remanescente que poderia impedir o Século Americano
total em todo o globo - a concretização do Domínio do Espectro Total, como o
Pentágono (Full Spectrum Dominance) o designava.(29)
Na
época do discurso do Presidente Putin, em 2007, na Alemanha, o mundo já estava
mergulhado numa Nova Guerra Fria. A Nova Guerra Fria não havia sido iniciada
por Moscovo. Mas, inevitavelmente, a certa altura Moscovo foi levada a reagir.
Desde que Putin ordenou a prisão do oligarca de petróleo russo, Mikhail
Khodorkovsky, em 2003, o Kremlin fez com que Vladimir Putin, da Rússia,
traçasse a linha contra o avanço da NATO, na conferência de Munique, em 2007,
colocando os motores do controlo económico, mais uma vez, nas mãos do Estado. A
decisão da Defesa dos Mísseis dos EUA (US Missile Defense) obrigou os motores do
Kremlin a trabalhar a alta velocidade.
A dinâmica desencadeada pelo
anúncio de Washington de uma política nuclear ‘preventiva’ tornou a guerra
nuclear por erro de cálculo, num risco muito maior do que até mesmo durante as
tensões mais profundas da Guerra Fria, incluindo a Crise dos Mísseis Cubanos,
de Outubro de 1962. Quanto mais Washington se aproximasse da capacidade
operacional dos seus sistemas de defesa antimísseis polacos e checos, maior era
a possibilidade dos estrategas do Kremlin poderem ver que a sua única esperança
de sobrevivência, era a realização de um ataque nuclear preventivo contra alvos
seleccionados na Polónia ou na UE, antes que fosse tarde demais para responder
eficientemente.
O
fracasso no Iraque, ou a perspectiva de um ataque preventivo nuclear táctico
dos EUA contra o Irão, eram suficientemente terríveis. Mas empalideciam, quando
comparados com o fortalecimento militar dos EUA em todo o mundo contra a
Rússia, o seu mais formidável rival que restava, a nível global.
As
políticas militares dos EUA desde o fim da União Soviética e o aparecimento da
República da Rússia, em 1991, necessitavam (e ainda necessitam)de um exame atento, neste contexto. Só depois dessa análise é
que os comentários, francos e sinceros, de Putin, em 10 de Fevereiro de 2007,
na Conferência da Segurança de Munique fazem sentido.
Putin
falou em Munique, em termos gerais, sobre a visão de Washington de um mundo
“unipolar”, com um centro de autoridade, um centro de força, um centro de
tomada de decisões, designando-o como um “mundo em que há um dono, um
soberano”. E no final do dia isto é pernicioso não só para todos os que estão
dentro deste sistema, mas também para o próprio soberano, porque se destrói a
si mesmo, a partir do interior”.(30)
É
claro que Putin não estava a falar sobre a Rússia, mas sobre a única
superpotência, os EUA. Então o Presidente russo chegou ao cerne da questão
Hoje assistimos a um quase
desenfreado híper uso da força – da força militar - nas relações
internacionais, força que está a mergulhar o mundo num abismo de conflitos
permanentes. Como resultado, não temos força suficiente para encontrar uma
solução abrangente para qualquer um desses conflitos. Também se torna
impossível encontrar um acordo político.
Estamos a ver um desprezo cada
vez maior, pelos princípios básicos do Direito Internacional. E as normas
legais independentes estão, de facto, cada vez mais próximas do sistema
judicial de um Estado. Um Estado e, é claro, em primeiro lugar e principalmente,
os Estados Unidos, que extrapolou as suas fronteiras nacionais em todos os
sentidos. Isto é visível na política e nas políticas económicas, culturais e
educativas que esse Estado impõe a outras nações. Bem, quem gosta disto? Quem é
que está feliz com isto?(31)
As
palavras de Putin começaram a tocar naquilo que preocupava a Rússia, sobre a
política externa e militar dos EUA desde o fim da Guerra Fria, citando
políticas militares explícitas que eram particularmente perturbadoras.
Ele alertou para o efeito desestabilizador das armas espaciais:
É impossível sancionar o
aparecimento de novas armas de alta tecnologia desestabilizadoras ... uma nova
área de confronto, especialmente no Espaço exterior. Star Wars não é mais uma
fantasia - é uma realidade… Na opinião da Rússia, a militarização do Espaço
exterior poderá ter consequências imprevisíveis para a comunidade
internacional e provocar nada menos que o início de uma era nuclear.
Planos para expandir certos elementos
do sistema de defesa antimísseis para a Europa não podem deixar de nos
perturbar. Quem precisa do próximo passo do que seria, nesse caso, uma
inevitável corrida armamentista?(32)
A
que assunto é que ele se estava a referir? Poucas pessoas estavam cientes de
que os EUA, no início de 2007, haviam anunciado que estavam a construir enormes
instalações de defesa antimísseis na Polónia e na República Checa. Os EUA tinham rodeado esse anúncio com falsas alegações de protecção, para se defender
do risco de ataques de mísseis nucleares de “Estados desonestos” de países como
a Coreia do Norte ou talvez, um dia, o Irão.
Polónia?
Defesa de mísseis balísticos? Do que se tratava? A fim de compreender a
natureza extremamente provocativa e perigosa da política nuclear de Washington,
era necessário analisar alguns conceitos militares básicos.
‘A Mão Direita para Alcançar o Ouvido Esquerdo”
Em
29 de Janeiro de 2007, o General Brigadeiro do Exército dos EUA, Patrick J. O`Reilly,
Vice-Director da Agência de Defesa contra Mísseis do Pentágono, anunciou os
planos dos EUA de instalar um sistema de antimísseis balísticos na Europa, até
2011. O Pentágono declarou que a instalação se destinava a proteger as instalações
americanas e da NATO contra ameaças de inimigos no Médio Oriente, não da
Rússia.
Após as observações de Putin em Munique, o
Departamento de Estado USA emitiu um comentário formal, observando que a
Administação Bush estava “perplexa com os comentários cáusticos repetidos de
Moscovo, sobre o sistema previsto”.(33)
Em
28 de Fevereiro, duas semanas após o discurso de Putin, o chefe da Agência Americana
de Defesa contra Mísseis, General Henry Obering, chegou à Europa, vindo de
Washington, para “explicar”os novos planos de mísseis dos EUA para a Polónia e para
a Europa Oriental. Reunindo-se na Bélgica com os 26 Embaixadores dos membros da
NATO e com a Rússia, Obering insistiu que o sistema de mísseis planeado era
totalmente defensivo por natureza e que o seu objectivo era fornecer protecção
contra um possível ataque do Irão.(34)
O
argumento de que uma hipotética ameaça de míssil iraniano aos Estados Unidos
exigia a instalação de defesas anti-míssil dos EUA na Polónia não era muito
convincente, especialmente, se os alvos imaginários estivessem realmente em
território norte-americano ou instalações críticas dos EUA na Europa.(35)
Analistas
sérios interrogavam-se por que é que Washington não perguntou ao seu antigo
aliado da NATO, a Turquia, se os EUA poderiam colocar lá o seu escudo
antimísseis? Não será que a Turquia está mais perto do Irão? Ou talvez o
Kuwait? Ou Catar? Ou Israel? Como Putin salientou no seu discurso, em Munique:
Armas de mísseis com um alcance
de cerca de cinco a oito mil quilómetros que realmente representam uma ameaça
para a Europa não existem em nenhum dos chamados países problemáticos. E no
futuro próximo e em perspectiva, isto não vai acontecer e nem é previsível. E
qualquer lançamento hipotético de, por exemplo, um foguetão da Coreia do Norte
para o território americano, através da Europa Ocidental, contradiz, obviamente,
as leis da balística. Como dizemos na Rússia, seria como usar a mão direita
para alcançar o ouvido esquerdo.(36)
Falando
no quartel-general da NATO, em Março de 2007, o General Obering disse que
Washington também queria instalar um sistema de radar antimíssil no Cáucaso,
provavelmente nas antigas repúblicas soviéticas da Geórgia e da Ucrânia, que
não eram membros da NATO, naquela época. A declaração de Obering provocou uma
resposta imediata e mordaz do porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros
da Rússia, Mikhail Kamynin, relatado pela agência de notícias Itar-Tass:
Esta afirmação é outra prova de
que o lado americano irá continuar a alargar o seu potencial de defesa
antimíssil, o que afectará cada vez mais a segurança russa. A Rússia
manifestou, repetidamente, a sua preocupação com os planos de defesa
antimísseis dos EUA. Pensamos que a escala dos preparativos dos EUA é
desproporcional à ameaça declarada de mísseis. A intenção dos EUA de instalar componentes
de defesa antimíssil, que se tornarão instalações militares estratégicas
próximas das fronteiras da Rússia, é uma fonte de preocupação especial. Teremos
de ter em mente as perspectivas dessas instalações em mais situações
político-militares russas e no planeamento militar. Estes planos contradizem o
compromisso da NATO de limitar a instalação de forças, o que foi feito no Acto
Fundador Rússia-NATO.(37)
Washington
fez uma lista de mais de 20 Estados que produzem mísseis balísticos. Além da
Rússia e da China, nenhum deles tinha mísseis que pudessem representar,
remotamente, perigo para a Europa ou para os Estados Unidos. E, com excepção da
Coreia do Norte e do Irão, todos eles cooperaram com os EUA, como a Rússia, a
Índia ou Israel, ou foram aliados de longa data dos EUA, como a França ou o
Reino Unido. Além do mais, o Irão estava a vários anos de distância de
desenvolver mísseis de longo alcance com ogivas nucleares e o suposto potencial
nuclear da Coreia do Norte era essencialmente fanfarronice (hot air/empty talk
that is intended to impress) e não uma ameaça real, de acordo com
especialistas militares ocidentais. (Nota
da T.: este livro foi publicado em 2009, portanto esta observação refere-se a
essa data ou mesmo antes.)
O
míssil balístico Taepodong-2, de Pyongyang, tinha um alcance estimado de 4.300
quilómetros. Quando a Coreia do Norte testou um míssil de longo alcance, em
Julho de 2006, o Presidente Bush ordenou que o Forte Greely, no Alasca, ficasse
em alerta máximo. No final, o míssil caiu no Pacífico, 40 segundos após o
lançamento. Não ficou claro quando é que a Coreia do Norte seria capaz de
produzir projécteis adequados com ogivas nucleares.
O
Irão, a partir do início de 2008, só tinha testado mísseis com alcance até
1.600 quilómetros. Até mesmo o modelo Shahab-5 supostamente de ponta do país,
provavelmente um derivado de um míssil do tipo norte-coreano Taepodong, foi
estimado ter um alcance de apenas 3.000 quilómetros. Portanto, as estações de
radar instaladas na Europa Oriental, não detectariam quaisquer mísseis iranianos
que se dirigissem para os Estados Unidos nos tempos vindouros.
Segundo
o Tenente General aposentado, Robert Gard, o programa americano de defesa
antimísseis foi um esforço para fornecer segurança contra mísseis iranianos que
ainda não existiam e que, hipoteticamente, poderiam usar ogivas que também
ainda não existiam. Além do mais, acrescentou, os iranianos estavam plenamente
conscientes de que os EUA os aniquilariam, se disparassem mísseis contra os
EUA.(38)
A elite de Washington não estava, nitidamente, a ser muito sincera sobre a sua nova estratégia de defesa
contra mísseis.
Moscovo
Reaje
Moscovo
perdeu pouco tempo a reagir ao anúncio dos planos dos EUA relatico aos seus sistemas
de defesa antimísseis balísticos (BMD) na Europa Oriental. O Comandante da Força
de bombardeio estratégica da Rússia, o Tenente General Igor Khvorov, em 5 de Março
de 2007, disse que as suas forças poderiam impedir facilmente ou destruir
qualquer infraestrutura de defesa antimíssil na Polónia e na República Checa,
precisamente onde os Estados Unidos se preparavam para instalá-los.
Duas
semanas antes, declarações semelhantes do Comandante das Forças Armadas
Estratégicas, o Coronel General, Nikolai Solovtsov, não deixavam a menor dúvida
de que Moscovo iria alvejar os arsenais nucleares dos EUA, se Washington
insistisse nos seus planos. (39)
Em
10 de Março de 2007, o Presidente da Federação da Rússia, Vladimir Putin fez um
discurso numa cerimónia militar de atribuição de prémios, no Kremlin, onde
anunciou que a Rússia gastaria 190 biliões de dólares, nos próximos oito anos, (cerca
de 5 triliões de rublos), para equipar o Exército e a Marinha com armas
modernas, em 2015. Putin disse que a “situação global” ditava a necessidade de
melhorar a estrutura militar da Rússia. “Não podemos deixar de notar as
constantes tentativas de resolver disputas internacionais pela força, a ameaça
de conflitos internacionais, a escalada de conflitos locais e a disseminação de
armas de destruição em massa”.(40) Foi uma repetição textual das suas observações
de Fevereiro, em Munique, onde ele se referiu aos EUA, citando o nome desse
país.
Putin
observou que uma parte considerável dos fundos seria destinada a comprar armas
e equipamentos da última geração e desenvolver a ciência e a tecnologia militar.
“Estamos a tentar integrar a indústria da Defesa no sector civil da economia,
principalmente nos sectores de alta tecnologia”, acrescentou. “As Forças
Armadas devem, de uma vez por todas, retomar a prática [permanente] de levar a
cabo exercícios militares em grande escala, lançamentos de mísseis e missões
marinhas remotas”, concluiu o Presidente russo.(41)
Com
palavras explícitas, Putin estava a responder às provocações crescentes de
Washington, ao declarar abertamente que a Nova Guerra Fria estava a acontecer.
Não foi uma nova Guerra Fria iniciada pela Rússia, mas uma à qual a Rússia, por
razões de sobrevivência nacional, foi forçada a responder.
O
mundo estava no início de uma nova corrida armamentista. Na primavera de 2007,
cerca de 17 anos após o suposto fim da Guerra Fria EUA-União Soviética, uma
nova corrida armamentista baseada em armas nucleares estava em pleno
desenvolvimento.
Um
dos poucos dirigentes ocidentais que manifestaram preocupação com o anúncio dos
planos dos EUA de construir defesas antimísseis na Polónia e na República Checa
foi o antigo chanceler alemão, Gerhard
Schroeder. Schroeder ganhou o estatuto de “inimigo”, de facto, do governo Bush depois de sua oposição à guerra do Iraque,
em 2003. Ao falar em Dresden, em 11 de Março de 2007, vários dias depois das
reflexões do Presidente Putin, em Munique, Schroeder declarou que os esforços
dos Estados Unidos, de instalar os seus sistemas antimísseis na Europa
Oriental, fazia parte de uma tentativa de prosseguir “uma política de cerco
irresponsável contra a Rússia”. Schroeder advertiu que essa política lançava
uma nova corrida armamentista global.(42)
Lei da Defesa contra Mísseis dos
EUA, de 1999
A
política dos Estados Unidos desde 1999, exigia a criação de alguma forma de
defesa antimísseis activa, apesar do fim da Guerra Fria e da ausência de
qualquer ameaça estruturada de lançamentos de mísseis ICBM soviéticos ou russos,
ou quaisquer outros. A Lei Nacional da Defesa contra Mísseis dos EUA de 1999
estipulava:
A política dos Estados Unidos é instalar,
logo que tecnologicamente possível, um sistema eficiente de Defesa Nacional
contra Mísseis, capaz de defender o território dos Estados Unidos contra
ataques limitados de mísseis balísticos, sejam acidentais, não autorizados ou
deliberados, com o financiamento sujeito à autorização anual de verbas e de
apropriação anual de fundos para a Defesa Nacional de Mísseis.(43)
A
defesa antimíssil era uma das obsessões de Donald Rumsfeld, como Secretário da
Defesa. Ela era uma aberração de uma camarilha excessivamente militarista ao
redor de Bush e de Cheney? Ou fazia parte
de uma estratégia muito mais perigosa para o domínio do mundo por uma poderosa
elite financeira e política empenhada na hegemonia mundial? A resposta foi
enterrada em políticas e programas que, considerados separadamente, pareciam
bastante inofensivos, mas quando colocados no contexto das políticas
concretizadas por Washington, desde Setembro de 2001, eram tudo menos
inofensivas.
Para
estabelecer a sua agenda estratégica a longo prazo a fim de manter o domínio do
mundo como Superpotência Única, os principais círculos dentro e à volta do
Pentágono e do Departamento de Estado dos EUA exigiram a concretização de uma
nova técnica revolucionária de mudança de regime, para impor ou instalar
regimes “amigos dos EUA” em todo o mundo na antiga União Soviética e em toda a
Eurásia. Os estrategas americanos iriam inspirar-se numa página do livro sobre
abelhas – ‘Enxame’ - como sendo um método de guerra encoberta e de mudança de
regime. ‘Swarming/Enxame’ foi o termo dado pela RAND Corporation para um novo
técnica de conflito militar. Baseada nos padrões de comunicação e nos
movimentos de enxames de insectos, aplicados ao conflito militar, essa técnica dependia
do uso de tecnologias de rede e de fluxosde comunicação.(44)
As
mensagens de texto e as novas tecnologias revolucionárias de informação, seriam
aplicadas à tarefa de avançar a agenda de Washington, do Full Spectrum
Dominance ou Domínio do Espectro Total ou Domínio Total da Universalidade.
Notas de rodapé:
1 George F. Kennan, Policy Planning
Study, PPS/23: Review of Current Trends in U.S. Foreign Policy, Memorandum by
the Director of the Policy Planning Staff (Kennan)2 to the Secretary of State
and the Under Secretary of State (Lovett), in Foreign Relations of the United
States, Washington DC, February 24, 1948, Volume I, pp. 509-529.
2 Arnold L. Horelick and Myron Rush,
Strategic Power and Soviet Foreign Policy, The RAND Corporation, Santa Monica,
California, R-434-PR, A Report Prepared for the United States Air Force Project
RAND, August, 1965, pp. 202-204. The US missile deployment in Turkey was kept
top secret, so that the American public was unaware of how provocative US
policies against the Soviet Union had been. The US missiles in Turkey were
mentioned briefly in a RAND study three years after, but the facts were only
declassified three decades later. In the October 26 International Herald
Tribune of 1996, ‘Chiefs Urged War in ’62 Missile Crisis,’ the article reported
details of just-declassified tapes from the John Kennedy White House. It
reported, “Mr Kennedy worried that Mr Khrushchev’s offer to remove Soviet
missiles from Cuba if the United States removed its nuclear missiles from
Turkey seemed so reasonable that it would turn world public opinion to the
Soviet side.’ The article cited Kennedy: ‘If we don’t take it we’re going to be
blamed, and if we do take it we’re going to be blamed…” It then gave the reply
of the Pentagon: ‘We don’t have any choice but military action’, General Curtis
Lemay, Air Force Chief of Staff insisted October 19, three days before the
public knew about the crisis. In the end, Mr Kennedy accepted the (Soviet
Turkey for Cuba missile) deal, though he managed to keep it a secret.’ Cited in
International Herald Tribune, October 26-27, 1996.
A instalação de mísseis dos EUA na Turquia foi mantida em segredo absoluto, de modo que o público americano não sabia quanto as políticas norte-americanas contra a União Soviética tinham sido provocadoras. Os mísseis americanos na Turquia foram mencionados brevemente, num estudo da RAND Corportation três anos depois, mas os factos só foram tornados públicos, três décadas depois. Em 26 de Outubro, o International Herald Tribune de 1996, "Chiefs Urged War in '62 Missile Crisis", o artigo relatou detalhes de gravações recentemente desclassificadas da Casa Branca de John Kennedy. “O Sr. Kennedy temia que a oferta de Khrushchev de retirar mísseis soviéticos de Cuba, se os Estados Unidos removessem os seus mísseis nucleares da Turquia parecesse tão razoável, que voltaria a opinião pública mundial para o lado soviético.” O artigo citava Kennedy: Se não aceitarmos essa proposta, vamos ser culpados e, se aceitarmos, seremos culpados ...” E depois, a resposta do Pentágono: 'Não temos outra escolha senão a acção militar',dada pelo General Curtis Lemay, Chefe do Estado Maior da Força Aérea, em 19 de Outubro, três dias antes que o público soubesse da crise. No final, Kennedy aceitou o acordo (retirada dos mísseis americanos da Turquia, em troca dos mísseis soviéticos de Cuba), embora tenha conseguido mantê-lo em segredo.”Citado no International Herald Tribune, de 26 a 27 de Outubro de 1996
A instalação de mísseis dos EUA na Turquia foi mantida em segredo absoluto, de modo que o público americano não sabia quanto as políticas norte-americanas contra a União Soviética tinham sido provocadoras. Os mísseis americanos na Turquia foram mencionados brevemente, num estudo da RAND Corportation três anos depois, mas os factos só foram tornados públicos, três décadas depois. Em 26 de Outubro, o International Herald Tribune de 1996, "Chiefs Urged War in '62 Missile Crisis", o artigo relatou detalhes de gravações recentemente desclassificadas da Casa Branca de John Kennedy. “O Sr. Kennedy temia que a oferta de Khrushchev de retirar mísseis soviéticos de Cuba, se os Estados Unidos removessem os seus mísseis nucleares da Turquia parecesse tão razoável, que voltaria a opinião pública mundial para o lado soviético.” O artigo citava Kennedy: Se não aceitarmos essa proposta, vamos ser culpados e, se aceitarmos, seremos culpados ...” E depois, a resposta do Pentágono: 'Não temos outra escolha senão a acção militar',dada pelo General Curtis Lemay, Chefe do Estado Maior da Força Aérea, em 19 de Outubro, três dias antes que o público soubesse da crise. No final, Kennedy aceitou o acordo (retirada dos mísseis americanos da Turquia, em troca dos mísseis soviéticos de Cuba), embora tenha conseguido mantê-lo em segredo.”Citado no International Herald Tribune, de 26 a 27 de Outubro de 1996
3 At the annual G7 summit of leading
Western industrial nations, meeting in Houston, Texas in June 1990, the Bush
Administration demanded that the IMF, an institution which Washington and the
US Treasury controlled since 1944, would be the sole dictator of the economic
transformation of the states of the former Soviet Union. It was to prove a
colossal blunder and one which made the emerging Russia increasingly skeptical
of Washington’s true motives at the end of the Cold War. In a true sense IMF
shock therapy and its forced imposition by Washington on Russia laid the first
seeds of a new phase in the Cold War back in 1990.
3
Na cimeira anual do G7, dos principais países industriais ocidentais, realizada
em Houston, Texas, em Junho de 1990, o governo Bush exigiu que o FMI, uma
instituição que Washington e o Tesouro dos EUA controlavam desde 1944, fosse a
única organização a administrar a transformação económica dos estados da antiga
União Soviética. Foi provado ter sido um erro colossal e que tornou a Rússia
emergente cada vez mais céptica em relação aos verdadeiros motivos de Washington, no final da Guerra Fria. Num verdadeiro sentido, a terapia de choque do FMI e a sua imposição forçada de Washington à Rússia, lançaram as primeiras sementes de
uma nova fase na Guerra Fria, em 1990.
4 Philip Zelikow and Condoleezza
Rice, Germany Unified and Europe Transformed, Cambridge, Harvard University
Press, 1995, pp. 180-184. US Ambassador to Moscow at that time, Jack Matlock,
confirmed in personal discussions with German researcher Hannes Adomeit of the
Stiftung Wissenschaft und Politik of the German Institute for International and
Security Affairs that he had been present and noted in his diary that US
Secretary of State James Baker III had agreed in talks with Soviet President
Mikhail Gorbachev that ‘Any extension of the zone of NATO is unacceptable.’
Curiously, Baker omitted the pledge entirely in his memoirs.
4 O Embaixador dos EUA em Moscovo
na época, Jack Matlock, confirmou em conversas pessoais com o pesquisador
alemão Hannes Adomeit, da Stiftung Wissenschaft und Politik, do Instituto
Alemão de Assuntos Internacionais e de Segurança, que ele estava presente e
observou no seu diário que o Secretário de Estado dos EUA, James Baker III,
concordara, durante as conversações com o Presidente soviético, Mikhail
Gorbachev, de que “Qualquer extensão da zona da NATO seria inaceitável.”
Curiosamente, Baker omitiu, completamente, esse compromisso nas suas memórias.
5 Dimitri K. Simes, Losing Russia:
The Costs of Renewed Confrontation, Foreign Affairs, Vol. 86. no. 6, Nov/Dec
2007.
6 Press Secretary, The White House,
ABM Treaty Fact Sheet, Announcement of Withdrawal from the ABM Treaty, December
13, 2001, accessed in http://www.whitehouse.gov/news/releases/2001/12/20011213-2.html.
7 Zbigniew Brzezinski, Second Chance:
Three Presidents and the Crisis of American Superpower, New York, Basic Books,
2007, pp. 1-2.
8 Zbigniew Brzezinksi, The Grand
Chessboard: American Primacy and Its Geostrategic Imperatives (New York: Basic
Books, 1997), passim.
9 Brzezinski, Second Chance.
10 Olesya Vartanyan and Ellen Barry,
Ex-Diplomat Says Georgia Started War With Russia, The New York Times, November
25, 2008.Former Georgian Ambassador to Moscow, and onetime close ally of
President Saakashvili, Erosi Kitsmarishvili, told a special Georgian
Parliamentary Commission investigating the background to the war that Georgian
officials had told him in April that they planned to start a war in Abkhazia,
one of two breakaway regions at issue in the war, and had received a green
light from the United States government to do so. He said the Georgian
government later decided to start the war in South Ossetia, the other region,
and continue into Abkhazia. Two days later, on November 28 at the same
Parliamentary Commission, President Saakashvili himself blurted out, "We
did start military action to take control of Tskhinvali and other unruly
areas…The issue is not about why Georgia started military action - we admit we
started it. The issue is about whether there was another chance when our
citizens were being killed? We tried to prevent the intervention and fought on
our own territory."
10
O antigo Embaixador georgiano em Moscovo e antigo aliado do Presidente
Saakashvili, Erosi Kitsmarishvili, disse a uma comissão especial parlamentar
georgiana, que investigava os antecedentes da guerra, que oficiais georgianas lhe
disseram, em Abril, que planeavam iniciar uma guerra na Abkhazia, uma das
regiões separatistas em questão na guerra, e receberam luz verde do governo dos
Estados Unidos para fazê-la. Ele disse que o governo da Geórgia decidiu, mais
tarde, iniciar a guerra na Ossétia do Sul, a outra região, e continuá-la na
Abkházia. Dois dias depois, em 28 de Novembro, na mesma Comissão Parlamentar, o
próprio Presidente Saakashvili deixou escapar: “Nós iniciámos uma acção militar
para assumir o controlo de Tskhinvali e outras áreas indisciplinadas ... A
questão não é, por que é que a Geórgia iniciou uma acção militar - nós
admitimos que começámos. O problema é se havia outra oportunidade, quando os
nossos cidadãos estavam a ser mortos? Tentámos impedir a intervenção e lutámos
no nosso próprio território”.
11 Lieutenant General Henry A.
"Trey" Obering III, Director Missile Defense Agency, briefing in
Brussels, Belgium, March 1, 2007, United States Mission to NATO, accessed in http://nato.usmission.gov/News/Obering_030107.htm.
12 George W. Bush, Presidential
Letter, September 19, 2003, accessed in http://www.whitehouse.gov/news/releases/
14 George F. Kennan, Op. Cit.
15 Peter Grose, Continuing the
Inquiry: The Council on Foreign Relations from 1921 to 1996, New York, Council
on Foreign Relations Press, 1996, pp.23-26.
16 Ibid. This official Council on
Foreign Relations account describes the then-secret 1939- 1942 CFR War &
Peace Studies project. One of the project leaders, Johns Hopkins University
President Isaiah Bowman, a geographer and student of British geopolitician
Halford Mackinder, once referred to himself as ‘America’s Haushofer,’ a
reference to Hitler’s geopolitical adviser, until he realized that it played
poorly among the American public that was being mobilized to war against Nazi
Germany. Describing the War & Peace Studies, Bowman wrote, ‘The matter is
strictly confidential because the whole plan would be ‘ditched’ if it became
generally known that the State Department was working in collaboration with any
outside group.’ Bowman was being disingenuous. It was working not just with
‘any’ outside group, but with the most powerful group of the American power establishment,
the CFR. The CFR project was directly financed by a significant contribution of
$350,000 from the Rockefeller Foundation. The project’s leading members were
quietly sent to senior positions inside the State Department to implement the
CFR postwar agenda for a Pax Americana or US global empire. The Bowman group
explicitly rejected using the term “empire” in order to deceive the rest of the
world as well as the naïve American public that America was ‘something
different.’ The idea of the United Nations was a centerpiece of their postwar
design.
16 Este relato oficial do Conselho de Relações Exteriores/Council on Foreign Relations (CFR) descreve o projecto secreto de então, designado como Estudos sobre Guerra e Paz do CFR de 1939-1942. Um dos líderes do projecto, Isaiah Bowman, presidente da Universidade Johns Hopkins, geógrafo e estudante do geopolítico britânico Halford Mackinder, referia-se a si mesmo como o “Haushofer dos Estados Unidos”, uma referência ao assessor geopolítico de Hitler, até se dar conta de que esse epíteto caía mal entre o público americanos que estava a ser mobilizado para a guerra contra a Alemanha nazi. Ao descrever os Estudos sobre Guerra e Paz, Bowman escreveu: “O assunto é estritamente confidencial porque todo o plano seria “descartado” se se tornasse conhecido que o Departamento de Estado estava a trabalhar em colaboração com qualquer grupo externo.” Bowman estava a ser falacioso. Ele estava a trabalhar não só com “qualquer” grupo externo, mas com o grupo mais poderoso do ‘establishment’ do poder americano, o CFR. O projecto CFR foi financiado directamente por uma contribuição significativa de 350.000 dólares, da Fundação Rockefeller. Os membros principais do projecto foram silenciosamente enviados para cargos de alto escalão dentro do Departamento de Estado, a fim de estabelecer a agenda pós-guerra do CFR para um império global dos EUA ou a Pax Americana. O grupo Bowman rejeitou explicitamente o uso do termo “império”, a fim de enganar o resto do mundo, como também o público americano ingénuo, de que a América era “algo diferente”. A ideia das Nações Unidas era uma peça central do seu projecto do pós-guerra.
16 Este relato oficial do Conselho de Relações Exteriores/Council on Foreign Relations (CFR) descreve o projecto secreto de então, designado como Estudos sobre Guerra e Paz do CFR de 1939-1942. Um dos líderes do projecto, Isaiah Bowman, presidente da Universidade Johns Hopkins, geógrafo e estudante do geopolítico britânico Halford Mackinder, referia-se a si mesmo como o “Haushofer dos Estados Unidos”, uma referência ao assessor geopolítico de Hitler, até se dar conta de que esse epíteto caía mal entre o público americanos que estava a ser mobilizado para a guerra contra a Alemanha nazi. Ao descrever os Estudos sobre Guerra e Paz, Bowman escreveu: “O assunto é estritamente confidencial porque todo o plano seria “descartado” se se tornasse conhecido que o Departamento de Estado estava a trabalhar em colaboração com qualquer grupo externo.” Bowman estava a ser falacioso. Ele estava a trabalhar não só com “qualquer” grupo externo, mas com o grupo mais poderoso do ‘establishment’ do poder americano, o CFR. O projecto CFR foi financiado directamente por uma contribuição significativa de 350.000 dólares, da Fundação Rockefeller. Os membros principais do projecto foram silenciosamente enviados para cargos de alto escalão dentro do Departamento de Estado, a fim de estabelecer a agenda pós-guerra do CFR para um império global dos EUA ou a Pax Americana. O grupo Bowman rejeitou explicitamente o uso do termo “império”, a fim de enganar o resto do mundo, como também o público americano ingénuo, de que a América era “algo diferente”. A ideia das Nações Unidas era uma peça central do seu projecto do pós-guerra.
17 Michio Kaku and Daniel Axelrod, To
Win a Nuclear War: The Pentagon's Secret War Plans, Boston, South End Press,
1987, pp. 30-31.
18 The plan, called JIC 329/1,
envisioned a nuclear attack on the Soviet Union with 20 to 30 atomic-bombs. It
earmarked 20 Soviet cities for obliteration in a first strike: Moscow, Gorki,
Kuibyshev, Sverdlovsk, Novosibirsk , Omsk, Saratov, Kazan, Leningrad , Baku,
Tashkent, Chelyabinsk, Nizhni Tagil, Magnitogorsk, Molotov, Tbilisi, Stalinsk,
Grozny, Irkutsk, and Jaroslavl." Detailed in Michio Kaku and Daniel
Axelrod, To Win a Nuclear War: The Pentagon's Secret War Plans, Boston, South
End Press, 1987, pp. 30-31. The secret Pentagon strategy since the end of the
Cold War to use modernization of its nuclear strike force and deployment of
missile defense technology is but a modern update of a policy established in
1945—Full Spectrum Dominance of the world, via the destruction of the only
power capable of resisting that dominance—Russia.
18
O plano, designado como JIC 329/1, previa um ataque nuclear à União Soviética
com 20 a 30 bombas atómicas. Destacava 20 cidades soviéticas para a serem
aniquiladas num ‘first strike’/primeiro ataque: Moscovo, Gorki, Kuibyshev,
Sverdlovsk, Novosibirsk, Omsk, Saratov, Kazan, Leningrado, Baku, Tashkent,
Chelyabinsk, Nizhni Tagil, Magnitogorsk, Molotov, Tbilisi, Stalinsk, Grozny,
Irkutsk e Jaroslavl. "Detalhado
em Michio Kaku e Daniel Axelrod, ‘To Win a Nuclear War: The Pentagon's Secret
War Plans’, Boston, South End Press, 1987, pp. 30-31.. A
estratégia secreta do Pentágono, desde o fim da Guerra Fria, para usar a
modernização da sua força de ataque nuclear e instalar a tecnologia de defesa
antimísseis é, apenas, uma actualização moderna de uma política estabelecida em
1945 - Full Spectrum Dominance/Domínio do Espectro Total do mundo, através da
destruição do único poder capaz de resistir a esse domínio - a Rússia.
19 Sir Halford J. Mackinder, The
Geographical Pivot of History, in Democratic Ideals and Reality, pp. 241-42,
255, 257-58, 262-64.
20 Ibid.
21 Brooks Adams, The New Empire, New
York, MacMillan Co, 1900.
22 William Appleman Williams, The
Frontier Thesis and American Foreign Policy, in Henry W. Berger (ed.), A
William Appleman Williams Reader, Chicago, Ivan R. Dee, 1992, pp. 90-96.
23 Brzezinski, The Grand Chessboard,
p. 40.. 24 Halford J. Mackinder, The Round World and the Winning of the Peace,
Foreign Affairs, New York, Vol. 21, No. 4, July 1943, pp.597-605.
25 Halford J. Mackinder, Democratic
Ideals and Reality: A study in the politics of reconstruction, New York, Henry
Holt & Co., 1919, p. 150.
26 Zbigniew Brzezinski, Op. Cit., pp.
38-39.
27 Valentin M. Falin, Russia Would
Have Faced World War III Had it Not Stormed Berlin, Novosti Russian Information
Agency, March 28, 2005, in en.rian.ru/rian/index.cfm?.
28 Michio Kaku and Daniel Axelrod,
Op. Cit., p.30. 29 Inderjeet Parmar, To Relate Knowledge and Action: The Impact
of the Rockefeller Foundation on Foreign Policy Thinking During America’s Rise
to Globalism 1939-1945, Minerva, Vol.40, Kluwer Academic Publishers, 2002.
30 Vladimir Putin, Rede des russischen Präsidenten
Wladimir Putin auf der 43. Münchner,
Sicherheitskonferenz,’ München, February 10, 2007.
31 Ibid.
32 Ibid.
33 David Gollust, US Reiterates
Missile-Defense Plan Not Directed at Russia, US State Department, Voice of
America, 15 February 2007
34 Der Spiegel, Europe Divided over
US Missile Defense Plan, March 5, 2007, Spiegel Online, English in www.spiegel.de.
35 Richard L. Garwin, Ballistic
Missile Defense Deployment to Poland and the Czech Republic, A Talk to the
Erice International Seminars, 38th Session, August 21, 2007, in www.fas.org/RLG/. Garwin, a senior US defense
scientist demonstrated the fraudulent nature of the US Government’s motivation
for its missile policy, p.17. Garwin asked, ‘Are there alternatives to the
Czech-Polish deployment? Yes…An Aegis cruiser deployed in the Baltic Sea and
another in the Mediterranean could thus provide equivalent protection of Europe
against Iranian missiles.’ Garwin, as
well, reached the same conclusion as Putin: the US missiles were being aimed
directly at Russia.
35 Garwin, um cientista sénior da defesa dos EUA, demonstrou a natureza fraudulenta da motivação do governo dos EUA da sua política de mísseis, p.17. Garwin perguntou: “Existem alternativas para a instalação nos territórios checo-polacos? Sim… Um cruzador Aegis implantado no Mar Báltico e outro no Mediterrâneo poderiam, assim, fornecer protecção equivalente da Europa contra os mísseis iranianos. ”Garwin também chegou à mesma conclusão de Putin: os mísseis americanos estavam a ser apontados directamente para a Rússia.
35 Garwin, um cientista sénior da defesa dos EUA, demonstrou a natureza fraudulenta da motivação do governo dos EUA da sua política de mísseis, p.17. Garwin perguntou: “Existem alternativas para a instalação nos territórios checo-polacos? Sim… Um cruzador Aegis implantado no Mar Báltico e outro no Mediterrâneo poderiam, assim, fornecer protecção equivalente da Europa contra os mísseis iranianos. ”Garwin também chegou à mesma conclusão de Putin: os mísseis americanos estavam a ser apontados directamente para a Rússia.
36 Putin, Rede des russischen,
München, February 10, 2007.
37 Today.az, Diplomat: US ABM in
Caucasus will affect Russian relations with neighbors, March 10, 2007, in
www.today.az.
38 Ralf Beste, et al, America’s
Controversial Missile Shield: Where Does Germany Stand?
[http://www.spiegel.de/international/spiegel/0,1518,473952,00.html]. SPIEGEL
ONLINE, March 26, 2007.
39 Viktor Lotovkin, ABM: Washington trying to
use Europe as a cover, in RAI Novosti,
[http://en.rian.ru/analysis/20070406/63267224.html], April 6, 2007. 40
Today.az,, Putin says $190 bln funding for military equipment, March 10, 2007,
in www.today.az.
41 Ibid.
42 Der Spiegel Online, Schröder
geißelt Bushs Raketenabwehr, 11 March 2007. www.spiegel.de. 43 US Congress, USA
National Missile Defense Act of 1999, 106th Congress, 1st Session, S. 269,
Washington D.C., Library of Congress, accessed in
http://thomas.loc.gov/cgibin/query/C?c106:./temp/~c106f0Hcte. 44 John Arquilla
and David Ronfeldt, Swarming and the Future of Conflict, (Santa Monica, CA:
RAND, MR-311-OSD, 2000).
A seguir:
CAPÍTULO
DOIS
Controlar
as Revoluções Coloridas da Rússia e os Golpes dos ‘Enxames’
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