Autor: Manuel Banet Baptista
Posted: 06 May 2019 03:03 PM PDT
Posted: 06 May 2019 03:03 PM PDT
A maior parte das pessoas não compreende até que ponto todo este
processo está ferido de profunda ilegalidade, que - neste caso concreto - é
absoluto sinónimo de injustiça.
Os professores tinham uma carreira, em que podiam progredir de
«escalão», mediante a frequência de acções de formação e dos anos de serviço. O
processo era mais exigente do que o da generalidade das carreiras da função
pública, onde as «diuturnidades», ou seja, os anos de serviço, eram o único
critério para se mudar de escalão remuneratório.
A carreira docente começou a ser atacada com as «reformas» (contra-reformas) de Lurdes Rodrigues, a ministra da educação do governo Sócrates, detestada pela generalidade dos docentes e por uma grande fatia da população. Neste governo Sócrates, foi feita uma autoritária reforma, que tinha o objectivo claro de dificultar o acesso dos docentes aos escalões superiores da carreira, limitando artificialmente o número de vagas e sujeitando-as a «provas» ou «concursos» que, na verdade, eram ilegais e inconstitucionais no seu desenho.
Mas, nessa época, havia uma «maioria» circunstancial de apoio ao governo PS, por parte da direita (PSD+CDS), para comprimir o «bolo» salarial nos docentes.
Com a entrada de Passos Coelho e da «troica», foram congeladas as progressões, mesmo as que já tinham sofrido forte restrição de progressão, sob o ministério anterior de Sócrates/Maria de Lurdes Rodrigues.
O tempo
de serviço tem de ser contabilizado na progressão de carreira, não pode ser
«congelado» para este fim e manter-se como tempo de serviço, para se atingir a
idade da reforma. A manutenção desta situação é absurda e ilegal.
A
brutalidade e ilegalidade flagrante deste processo foi razão importante para
rejeição - quase unânime - do governo da «Troica», mesmo pelas pessoas
ideologicamente situadas à direita.
Os
socialistas obtiveram um bom score eleitoral, em parte, porque as pessoas
tinham a ilusão de que eles iriam repor a legalidade. Mas, na verdade, eles
estavam ao serviço da recuperação 100% capitalista da economia, ou seja, de uma
continuação da austeridade para os trabalhadores e os funcionários, até perder
de vista, e da abertura ainda maior para os negócios, para a especulação, para
os capitalistas usarem mão-de-obra barata, que lhes é oferecida pelo governo.
Não se
pense que as pessoas da função pública são uns «mandriões privilegiados», como
a descreve insultuosamente a media ao serviço da classe capitalista (esta sim,
parasitária, na sua imensa maioria, neste país...). Pense-se antes que são
trabalhadores obrigados a «comer o pão que o diabo amassou», como os outros.
Acontece que, devido à importância numérica relativa dos empregos na função pública,
a melhoria dos salários desta, obriga - a breve trecho - rever as tabelas
salariais nos sectores privados.
Os trabalhadores das carreiras técnicas - em particular - podem assim receber um impulso salarial indirecto, devido à melhoria dos colegas de profissão no sector público.
Porém, os que querem manter uma estrutura capitalista atrasada - baseada em baixos salários - precisam que o Governo lhes garanta que os trabalhadores da função pública não têm qualquer «privilégio» (como eles dizem!), ou seja, que venham a usufruir de nível salarial semelhante aos seus colegas doutros países europeus.
A
presente crise resulta da involução do PS, de um partido dito de «charneira»,
pelo menos ao nível sociológico, para um partido totalmente refém dos sectores
mais atrasados do capitalismo nacional: os que apostam nos salários de miséria,
quando são empresários ou apenas parasitas e especuladores dedicados a sacar
lucros no curto prazo, com a bolha imobiliária nas grandes cidades, etc...
As
estruturas produtivas deste país continuam reféns deste domínio duma classe
capitalista, parasitária do Estado, que está no entanto sempre a clamar contra
o mesmo... uma «rábula» que já não convence ninguém!
- Mas,
isto é possível, porque a classe política maioritária deixou-se capturar
completamente pelos seus interesses, ou é composta ela própria por aquele
sector da classe capitalista. Ela está, de facto, ao serviço directo deles,
como dos grandes monopólios internacionais e da banca e sector financeiro
(muito largamente, dominados por capital estrangeiro, de várias proveniências).
Seria
interessante fazer-se um estudo aprofundado sobre os últimos decénios do
que eu designei como o «complexo neo-colonial português»: como
se passou dos governos Sócrates, com um certo patamar no desmembramento do
tecido produtivo e da capacidade de desenvolvimento do país, à imposição de
políticas de austeridade da troica no governo Passos Coelho, para se chegar,
por fim, a uma falsa «redenção» através da famosa «saída da crise». Esta saída
deveu-se ao crescimento do turismo, grandemente favorecido (sobretudo a partir
de 2011) pela instabilidade e guerra em quase todos os países mediterrâneos,
destinos com os quais Portugal competia pelo turismo, em tempos normais.
O que é
facto, é que a reposição das condições de carreira dos docentes são apenas um
mínimo, não são privilégio, nem são uma excepção.
Aquilo que mais enoja é ver os lacaios disseminados por uma série de órgãos de comunicação social, que vão colocando sectores do povo uns contra os outros. Eles, realmente, estão ao serviço da parasitagem, que beneficia das condições de super-exploração.
Aquilo que mais enoja é ver os lacaios disseminados por uma série de órgãos de comunicação social, que vão colocando sectores do povo uns contra os outros. Eles, realmente, estão ao serviço da parasitagem, que beneficia das condições de super-exploração.
Mas, enquanto as coisas forem assim, haverá cada vez menos profissionais de qualidade em Portugal, não apenas na docência, como em todas as outras profissões com formações de longa duração.
É que os jovens, compreensivelmente, preferem ir para outras paragens, onde as suas capacidades e entusiasmo são melhor remunerados.
A «drenagem dos cérebros», causa um empobrecimento geral, sorrateiro, silencioso, mas irreversível e brutal ...
As instituições, públicas ou privadas, ficam privadas dos melhores deste país. A mediocridade perpetua-se; com ela, o atraso estrutural do país.
Fonte: https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2019/05/a-charada-da-reposicao-do-tempo-de.html
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